segunda-feira, 19 de junho de 2017

Avante, Júpiter

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O horizonte já anunciava o nascer duma nova manhã. Olhei por entre os galhos daquela árvore solitária e fui atingido por uma epifania que me trouxe paz: aquela que sempre me violava e preenchia ao acordar e te ver dormindo ao meu lado ou quando eu acordava e você abria aquele sorriso que me desestabiliza até hoje. Aquele gradiente pretazul ilustrou esse momento.

O relógio marcava 5:20 da manhã e eu era tomado por uma sensação de infinidade finita. As vidas continuavam dentro das casas ao meu redor: por trás daquelas portas, muros e portões, pessoas despidas de pudor amavam-se naquele exato instante. Em alguma daquelas casas, o cheiro de café sendo preparado tomava conta da cozinha e dos quartos. Um despertador tocava num canto do quarto alertando que era hora de trabalhar. Um cigarro era acesso para acalmar a ansiedade. Os carros eram conduzidos por pessoas recém-saídas de seus infinitos particulares. Eu apenas confabulava em silêncio com o universo. Uma a uma, as luzes dos postes eram desligadas.

O tempo estava muito ameno pruma cidade em que o calor reinava. Ao entrar em contato com a minha epiderme, o vento leve e gélido me fazia estremecer. Não soube como enxerguei tudo aquilo antes, mas meus olhos estavam fechados. Fui despertando desse transe quando o sol começou a lançar os seus primeiros raios ultravioletas em mim. Abri os olhos e estava sorrindo.

Saquei o telefone e tirei algumas fotos. Eternizei mais uma das infinitas memórias que me remetem a você. Comecei a andar na direção contrária da árvore. Avistei Júpiter em meu caminho. Segui a trilha, e por mais que a vontade fosse olhar novamente para aquela árvore e me sentir em casa, não pude fazê-lo.

Foi um dia excelente.


quarta-feira, 17 de maio de 2017

Apenas um sonho

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(Foi difícil acordar) 

Eu não queria, essa era a verdade. Desativei todos os 7 despertadores com os olhos fechados e o pensamento fixo em você. Ao abrir os olhos e saber que tudo não passava de um sonho, quis vender o resto da minha alma ao Morpheus: tudo em troca de sonhos nos quais a realidade era você e eu.

E, toda vez que desperto desse pedacinho do meu subconsciente que me leva até você sem que eu possa controlar (como se eu quisesse ou pudesse), o que me resta é esse estado introspectivo que não quer ser compreendido por ninguém a não ser a mim mesmo. Fecho os olhos, me recolho em minha casca e faço um mergulho profundo no meu ser. Sequer sei nadar - todos sabem - mas aprendi a sobreviver. Abro os olhos e estou flutuando. Há uma luz acima de mim na qual ilumina o azul ao meu redor de uma forma única. O que acontece comigo nesse intervalo de tempo funciona como no jogo tetris: enquanto novas peças surgem para serem encaixadas, outras são removidas. Entretanto, a peça na qual tem o seu nome cravado, nunca é destruída ou sobreposta. Devo retornar, o barulho me chama mais uma vez. Dou um impulso em direção àquela luz e me deixo ser sugada até a superfície. Antes de alcançar toda aquela luminosidade, escuto a sua doce voz ecoando dentro de mim.



(Devo acordar)

Será difícil, mesmo após esse estado mental e espiritual, ter um dia produtivo e tranquilo. Será quase impossível levar um bom dia sabendo que tudo não passou de um mísero sonho, no qual todos olham para o centro do palco, com aquele holofote focando na cena cômica que o sonho foi, e gargalham até chorar. Coloco um pé de cada vez no chão e sinto o frio do azulejo subindo pelas minhas pernas. A minha respiração é lenta, mas compassada e profunda. Reúno todas as forças que encontrei anteriormente e levanto.

Tenho a certeza de que amanhã será um novo dia.

(Vivamos o dia de hoje)

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Verão no Outono

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Aquele era, possivelmente, o encontro mais aleatório e inimaginável. Há quantos anos eles foram apenas dois figurantes irrelevantes na vida um do outro? Não lembravam bem, mas aquilo era peculiar e engraçado. Além disso, estava sendo gostoso de se viver.

A única luz que banhava diretamente os seus corpos era emitida do pisca-pisca acima deles. As janelas estavam abertas e já era tarde da noite: as pessoas dormiam e eles desejavam-se. Deitado e completamente despido de pudor ou qualquer tecido que mascarasse o seu desejo e fervor, ele a viu caminhando até a cama.

Quando uniram os corpos, cada toque gerava uma sensação diferente e única. Inicialmente, olharam-se com malícia e desejo. As bocas estavam entreabertas na expectativa de serem preenchidas pelo prazer doutrem. Mesmo a diferença daqueles 30 centímetros de altura não impediram que seus corpos se encaixassem com harmonia e desenvoltura. Ela o entrelaçou com as suas pernas enquanto ele tinha uma das mãos entre os seus cabelos e a outra no meio de suas costas. Os beijos foram cheios de tesão e carregados de calor. Ela era o verão.

Giraram suavemente na cama e ele a deitou. Podia vê-la de cima, ali brilhando em seu calor e com as sardas criadas pela luz vermelha do pisca-pisca. Ela via o seu rosto e sorria com o sorriso mais acolhedor que possuía. O corpo dele, contrastado pela luz da rua que entrava pela janela e todo o breu do quarto, caiu lentamente sobre ela. Foi beijando o seu pescoço devagar e dando mordidas em sua orelha. Mordeu com mais força o seu queixo e começou a beijar o seu colo. Subitamente, encontrou os seus seios e preencheu a sua boca com aquele mamilo com um piercing. Fez a mesma coisa com o outro seio. Foi de encontro ao Delta de Vênus dela e beijou todo o seu corpo até lá chegar. Ele era o outono.

Enquanto sentia todo o seu calor, ali entre as pernas dela, também podia ouvir os gemidos e a respiração ofegante que ela emitia. Ela era doce e ele gostava do seu sabor. Quando o empurrou para longe porque já não conseguia mais aguentar, ele tirou as mãos dos seus seios e a língua de dentro dela. Apesar dele estar pingando de suor, quando olhou praquela boca entreaberta e molhadinha de prazer, eles se chocaram mais uma vez.

Montou nele e cavalgou como que a sua vida dependesse daquilo. Apesar de estar sem prática, ele fez o melhor que pôde. Era uma visão prazerosa vê-la subindo e descendo enquanto estava dentro dele. A playlist que tocava ficou em segundo plano e, creio que até inaudível, devido ao ápice de seus prazeres. Ele gargalhou bem gostoso e a abraçou firme enquanto estremeciam de puro prazer. Ambos pingavam de suor, mas estavam abraçados e trocando carícias. Ela era o verão em pleno outono.

segunda-feira, 8 de maio de 2017

Há quase um ano...

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Carta aberta pra você.


Há quase um ano nós tivemos a nossa última noite juntos. E, há quase um ano, ninguém me tocou com tanta ternura e amor como você naquela noite. Tudo foi há quase um ano e eu ainda posso sentir o teu olhar me fotografando, bem como o teu sorriso que tanto me derretia (e ainda derrete) inteiro por dentro. Há quase um ano eu perdi muito mais do que um baita mulherão... Eu perdi uma irmã, a minha melhor amiga, um brother. Parece que foi ontem, mas tudo foi há quase um ano. Ainda lembro, que há quase um ano, estávamos assistindo Stranger Things jogados na sala: você comendo o seu lanche versão kids (que nunca conseguia comer tudo e sempre sobrava pra mim), e eu comendo o maior lanche possível do estabelecimento que gostávamos de pedir. Há quase um ano eu venho vivendo numa realidade totalmente sem cor. Aqui, nessa realidade, todos foram pintados de negro e eu não posso enxergá-los, muito menos eles a mim. Há quase um ano eu venho tentando sobreviver com uma lanterna que achei jogada numa caixa empoeirada. É um labirinto sem tamanho que estou percorrendo, e várias vezes a lanterna falha, pisca mais que as luzes no Natal, só que no final ela ainda sobrevive. A luz não é tão forte, mas sei que ela não se apagará. Há quase um ano e eu ainda sinto o que senti quando me abri pra você pela primeira vez. Acho que foi no lago da universidade, a gente estava na grama e eu chorava e te abraçava porque era tudo muito lindo e eu só queria me fundir a você: de corpo e de alma. Há quase um ano eu não posso dividir o meu dia a dia contigo: nem minhas tristezas ou as alegrias. Há quase um ano eu não sei o que é trocar um sorriso sincero (mesmo eu não sabendo sorrir). Há quase um ano, os nossos planos tiveram que ser engavetados no plano real. Há quase um ano eu me aposentei do back vocal dos Macacos do Ártico, e também deixei de assistir as Vídeo Cassetadas do Faustão. Se pá, um dia cê for até a Argentina e, se pá, lembre, remotamente, que era um dos nossos destinos quando as coisas melhorassem... Há quase um ano eu desejo que as coisas aconteçam graciosamente nas nossas vidas. O lápis em minhas mãos furou diversas páginas abaixo do que acabei de escrever. As palavras estão borradas pelas lágrimas que ainda vem ao lembrar que você já não está mais ao meu lado (toda encolhida, pois sou espaçoso) toda vez que acordo. Essas lágrimas surgiram há quase um ano. Há quase um ano eu venho vivendo uma eternidade sem você.


Rodrigo.

sexta-feira, 3 de março de 2017

Insular

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Transcendi todas as leis da física naquele momento, disso eu havia certeza. Momento esse em que fechei os meus olhos e fui teletransportado: mental e fisicamente. Ao abrir os olhos novamente, só conseguia enxergar os teus. Vagueei na imensidão infinda do teu olhar enquanto ouvia as ondas quebrando nas rochas.

Estava descalço e sem blusa, mas nada mais importava quando a verdade era que estava com a alma desnuda. Não fazia diferença alguma vestir ou não aquelas roupas. Não fazia sentido rotular tudo, e refutava todo e qualquer lampejo de pensamento sobre isso. Entretanto, gravados em seu coração, carregava duas metades que brigavam constantemente: a primeira era cheia daquilo que “um dia poderia ter sido”; e a segunda transbordava esperanças vãs de um dia ainda tê-la consigo. Eu sou o caos.

Dia após dia, pegava-se com aquelas duas metades fundidas numa confusão mental. Era subversivo ir contra isso. Eu devo ser subversivo. Percebi tarde demais que o teu abraço era um santuário pra minh’alma repousar. E o que eu fiz com isso? Disparei em retirada como se a minha vida dependesse dessa fuga. E o que eu faço com o que me tornei? Fugir já não é mais uma opção. Desculpa o egoísmo, mas eu penso se você acreditou que todas as tentativas de te ter comigo mais uma vez foram reais. Já revivi essa novela várias e várias vezes na busca de alguma solução. Felizmente ou infelizmente, entendi que a solução não era essa.

Abri os olhos e realmente enxergava os teus. A areia em minha pele causava uma sensação engraçada e gostosa de formigamento. Teus olhos e a tua boca me contaram as melhores histórias que um dia eu sequer cheguei a imaginar. Os levava sempre comigo. Consegui me levantar aos poucos. Os pássaros voavam tranquilamente no horizonte acima de mim, e aos pouco percebi em qual lugar estava.

Era uma ilha.

E, desconfortavelmente, eu me adaptei a ela. Não havia mais ninguém ali além de mim. Com o passar dos dias, fiz descobertas sobre quem eu realmente era. Ninguém mais se aproximaria da ilha que me tornei.

Insular.




segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Você só vive uma vez

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Mesmo no escuro, o chão estava salpicado dum carmesim que pulsava num ritmo contínuo. Levou as mãos ao rosto antes de ser acometida por outra vertigem: as coisas ficavam distantes e rodopiavam sem parar. Travou a respiração, reuniu forças e conseguiu contar até 12 (o dia da sorte deles) e as coisas se acalmaram. Prosseguiu a sua caminhada rumo ao desconhecido.

As ruas estavam desertas, a não ser por ela e o brilho da lua que irradiava reflexos azuis nos prédios adormecidos. Sentia-se bem sozinha, em sua plenitude. Exercitava canalizar o que existia de melhor em sua essência e buscava dissipar tudo aquilo que não lhe apetecia. Já havia se perdido na quantidade de vezes que estava ouvindo o mesmo álbum de The Strokes só naquele dia. I'll be waiting for you, baby...

Sentiu que outra vertigem estava se aproximando e, antes de deixar-se rodopiar para o além mais uma vez, sentou no banco de madeira do pier que estava a sua direita. O som da maré e a brisa salgada a acalmaram instantaneamente. Acompanhou o reflexo da lua no mar até o ponto em que seus olhos conseguiam alcançar. A plenitude de momentos assim era única e ficou grata por sem quem era.

Após um tempo que não soube contabilizar em segundos, minutos ou horas ali sentada, olhou para trás repentinamente. Aquela mancha carmesim a perseguia e percebeu que estava sangrando. Infelizmente, sabia exatamente em qual lugar aquela ferida estava localizada. Sangrava de dentro para fora. Sit me down, shut me up, I'll calm down and I'll get along with you...

Soube que era um processo gradual. Sonhara com ele repetidas vezes durante aquela semana: era sempre o último sonho antes do despertar violento. Acordava no susto, agoniada e lutando com todas as forças para voltar ao sonho, sendo ele bom ou não. Queria acreditar que ele também sonhava com ela, e que, como às vezes se lembrava dos sonhos, que ele precisava dela tanto quanto a recíproca era válida. Não mendigaria o amor do seu amor. I can't see the sunshine...

Fez de tudo para não pensar, mas descobriu que não querer pensar já era pensar. Poderia fazer as suas coisas, escalar processos prioritários, mas ele sempre estaria lá. Ele era um processo rodando em segundo plano e ela teve que matá-lo. No final, o seu jardim renasceria mais belo e mais forte, sem mágoas. Ao sair para a feira, venderia o que houvesse crescido de melhor: no final, a gente só oferta o que tem. Alright...

Retirou o notebook da sua mochila, abriu o terminal e digitou, pela milésima vez, mesmo sabendo que era em vão, o seguinte comando finalizá-lo:

root@he:~# kill -LOVE pid

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Há uma luz que nunca se apaga

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Lia os devaneios salpicados na parede do quarto, juntamente com desenhos que não faziam muito sentido caso não os considerasse como arte abstrata. Não colocava data em seus escritos: gostava de lembrar qual sentimento estava martelando ao ter escrito aquilo. Escrever era transcender todas as barreiras que existiam entre o seu cérebro e o ato de contar tudo aquilo que se passava lá dentro.

Olhou para o caderno em suas mãos, caderno esse que menos da metade das folhas estavam em branco. Quase que mecanicamente, releu -pela nonagésima vez- o que acabara de escrever:

Cientificamente, o preto é a ausência de luz; mas esse conceito não se aplica ao rombo escuro que a tua partida causou. Tudo foi desvanecendo aos poucos, e senti que poderia ter caído em sono profundo sem me importar muito com as consequências. Ainda sinto, e sinto muito. 
Ao sair - pela última vez - do meu campo de visão, sequer imaginava o tamanho que a tua falta ocuparia aqui dentro de mim. Os teus olhinhos de ressaca entrecortados pelas grades do portão ficaram tatuados na minha alma. Montei na moto e tive que partir... Que tolo! A tua ausência me transbordou. 
Às vezes, o amor se despede. A gente fica naquela neura de como isso pôde acontecer e em busca de infinitas soluções. Felizmente ou infelizmente, nem sempre o sentimento pode ser levado em consideração quando as coisas atingem um ponto crítico. E, é difícil. Se sentir "sei lá" é doloroso. 
O cômodo da saudade é claustrofóbico. Aqui nele, tudo é escuro e não há móveis: é possível ouvir teus passos e a tua voz me contando sobre todos os nossos momentos juntos. Cada fodendo lembrança dessa, desde a melhor até a pior, é gravada, a sangue frio, em minh'alma. 
A tua luz foi o meu guia. Grato por ter sido banhado pelo teu prisma de energias positivas. Gratidão por ter conhecido uma pessoa única no espaço-tempo enquanto o nosso espaço-tempo foi vivido (intensamente). Grato por saber que a evolução é constante e seremos melhores do que o que fomos no passado e do que somos hoje. Há muito o que ser dito, e mais ainda a ser ouvido e sentido. 
Vai pela sombra da calmaria e com paz no coração. Que a luz verde esteja sempre contigo. Sou grato por você.

Fechou o caderno rapidamente e o baque seco ficou ecoando pelo resto do quarto por um bom tempo. Percebeu que estava chorando quando sentiu as lágrimas quentes escorrerem por entre as mãos. Fechou os olhos para organizar as ideias e a viu: estava sorrindo com os seus olhinhos pelos quais ele seria eternamente apaixonado. Pegou o seu discman, colocou os fones de ouvido e apertou no aleatório. Tocava The Smiths e ele dançou.