Naquela
noite em sua cama, resolveu escrever. Escrevia sobre devaneios, sobre pessoas e
sonhos afogados por ilusões vividas e tão pouco esquecidas. A morte era o seu
tema favorito. Doce, mas cruel,
pensou com um sorriso nos lábios. Quando a caneta estava entre os seus dedos,
era transferido para outra dimensão; um mundo somente seu e cheio de perigos. Perguntava-se
de qual lugar aquelas palavras bonitas brotavam no papel do antigo caderno de
composições musicais que um dia tentara escrever enquanto era envolvido pela
vida boemia. Não são as
melhores criações, mas são as únicas que fiz. A vida que escolhera era
cortada por caminhos obscuros e densos que, até mesmo um demônio, perder-se-ia
com facilidade. O aroma agridoce do quarto escuro o envolveu e pôs-se a
escrever, lenta e firmemente.
Adormeceu logo em seguida. Estava
exausto do dia e das pessoas ao seu redor. Que
pessoas, otário? Não havia
ninguém ali. Que a verdade seja dita: era um solitário de carteirinha. Só tinha
vadias naquela jornada repleta de crateras. Foi largado pela única mulher que
amou mais que a velha matriarca que o criara. Quanta saudade sentia? Nem sabia
dizer. Foram longos verões ao lado do afago feminino que o levava ao delírio.
Nos seus sonhos, ela sempre estava presente. Lena,
costumava chama-la durante a intimidade do casal. Pensando bem, Helena era um
ótimo nome para ela. Viveram durante anos e nunca passou pela sua cabeça que
estava sendo traído pela mulher que compartilhava a sua cama. É inevitável, os relacionamentos
sempre acabam, tentava amenizar a martirizarão com o término da relação. Servi para algo, afinal. Sofrer é o
meu castigo. Helena separou-se dele no dia do seu aniversário. Estava
cansada da velha ladainha e tinha conhecido outra pessoa, afirmou. Que presente! Ela não quis nada dele, apenas o
deixou arruinado e com uma casa habitada pelos fantasmas sussurrantes de sua
presença.
Ouviu falar que o seu novo marido
havia morrido, mas não a procurou. Acreditava que quando as pessoas precisam de
algo, elas sempre encontram alguém para mendigar. O sonho daquela noite não foi
diferente dos demais: estavam no antigo campus de sua faculdade, com Helena no
colo e excitado pelo beijo que acabara de ganhar. Porém, sentiu algo estranho
no ambiente; um silêncio que nunca existira e um horizonte tão negro como uma
mortalha recém-lavada. Entre as poucas árvores do campus, uma jovem se
esgueirou e partiu na direção deles. A jovem era quase linda, se não houvesse sangue
por suas calças jeans e arranhões pelos braços e o rosto. Portava uma arma,
notou de súbito. Ambos ficaram estáticos, porém a jovem continuou vacilante e
com lágrimas de sangue nos olhos. Era um triângulo amoroso de sexta-feira 13 e
ele não ficara sabendo? Então a moça estava com a arma apontada a poucos metros
deu seu coração, quando, de longe, ouviu os riffs de smoke on the water em seus
ouvidos.
Acordou assustado. Era madrugada e
estavam ligando de forma restrita para ele. Que
diabos, praguejou. Pegou o telefone e disse: - Alô?
- Pai, precisamos conversar. Uma
voz rouca disse.
Pai?
Isso era engano. Não tinha filhos. Deveria ser engano, mas no momento, sentiu
algo diferente naquela frase.
1 trocas:
A escrita tá impecável! Isso parece um bom começo de uma jornada do personagem numa tentativa de esquecer o "fantasma do passado". Completamente desacreditado e amargurado, até que num belo dia ele encontra algo que o instiga a reavaliar seus conceitos, a redescobrir o lado bom da vida, mas que não seria uma tarefa fácil. Só que quando ele menos espera, já se vê envolvido demais na nova situação, porém o medo de que tudo se repita prejudica as coisas e o impede de seguir em frente. Terá que lutar contra si mesmo, e se verá num lugar onde ele é quem partirá corações desta vez. Um ótimo drama. asuhaushusahuahasusa' Ou... talvez uma bela tragédia, num processo de autodestruição total! O que, embora nada romântico, seria lindo também! u.u kkkkkkkk
=D
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